Quando escrevi um Direções com esse título há quase um ano estava indignada por a mídia eleger um mendigo chinês como ícone de estilo, os escândalos sexuais envolvendo o fotógrafo Terry Richardson e a exploração da Tevi Gevinson. Durante a última semana, com os acontecimentos surreais da temporada de desfiles de Paris, fiquei pensando em fazer outra coluna com o mesmo título e convidar nossos leitores a debater essa delicada questão.
John Galliano – outono/inverno 2011-12
Li ótimos artigos do Colin McDowell no BoF, da Cathy Horyn no NYTimes e no WWD sobre os recentes episódios envolvendo John Galliano e sua demissão da Dior, os rumores sem fim sobre a saída de Stefano Pilati da YSL, Hannah McGibbon, da Chloé, entre outros, e a ausência misteriosa de Christophe Decarnin no fim do desfile da Balmain. Todos questionam a responsabilidade da indústria e a pressão que os estilistas sofrem para criar sucessos de vendas quase interruptamente e a permissividade em relação ao uso de substâncias ilícitas.
Balmain – outono/inverno 2011-12
Acho que a pressão profissional acontece em todas as funções – do presidente de uma grande empresa a um motorista de ônibus numa cidade de trânsito caótico – e o abuso de drogas, álcool, remédios etc nem de longe é exclusividade da moda. Porém, o X da questão está na exposição que os envolvidos com a moda sofrem. Estilistas e editores viraram estrelas da internet, da TV, das revistas e da mídia em geral e seus passos são seguidos detalhadamente assim como o das celebridades de Hollywood. Qualquer pequeno deslize ganha uma dimensão anormal. Só para comparar, nem Mark Zuckerberg é tão exposto quanto um Marc Jacobs, por exemplo (mesmo com um filme controverso sobre a criação do Facebook!).
Todo esse frenesi sobre a moda só prejudica a própria indústria. Como? Diante da necessidade de produzir desfiles-show, campanhas de impacto e, em média seis coleções anuais com extremo sucesso comercial, além de linhas secundárias, de acessórios e de cosméticos se perdeu a razão de ser da própria moda, ou seja, a roupa. Quem liga para o valor da construção e modelagem de uma peça, quem valoriza um vestido como um real produto de design quando se está sempre em busca do “the next big thing”? Que a criatividade dos estilistas está cada vez mais a serviço do business não há dúvidas. Muitos alegam que é a demanda do consumidor que obriga o modo de produção frenético mas poucos pararam para se perguntar se é isso mesmo que os clientes querem e esperam de uma marca.
Alta-costura primavera 2011 da Dior
Talvez, no fim das contas, a indústria não prejudique seus funcionários, mas ela mesma, numa escala muito maior e de proporções ainda imprevisíveis. Talvez a moda não tenha que salvar John Galliano, Christophe Decarnin etc porque é a própria moda a grande vítima de sua irresponsabilidade por negligenciar o que tem de mais especial. E agora, quem vai salvá-la?