Inspirado na obra de Álvaro Apocalypse, fundador do grupo “Giramundo” de teatro de bonecos, Fraga nos presenteou com uma performance contundente que arrancou aplausos incessantes do público. O título da coleção, “Tudo é Risco de Giz”, faz alusão à obra em questão, e não faltou branco. Incríveis e lúdicos, os assessórios eram broches e bolsas em forma de quadro-negro. Mas o ponto alto é realmente o arrebatamento que toda a mis-en-scène provoca.
Jackson Five, bonecos de marionete, giz, crianças e idosos. Esses elementos só poderiam mesmo se unir na passarela de Ronaldo Fraga, dono de uma criatividade assombrosa e que nos brinda sempre com um desfile emocionante, além de peças com acabamento impecável e modelagens que priorizam o conforto.
Numa passarela cheia de grandes bonecos brancos (que foram manipulados durante toda a performance) entraram senhoras, isso mesmo, senhoras da terceira idade (ou melhor idade) de cabelos brancos vestindo as criações de Fraga. Elas faziam pose em frente ao pit de fotógrafos e eram fortemente aplaudidas pelos expectadores pegos de surpresa. Os vestidos tipo camisa de manga comprida tinham saia de fileiras de babadinhos, a estampa de listras cáqui enfeitou vestidos e ternos. Senhores, igualmente de cabeças alvas, repetiam a atitude, e alternavam-se com crianças que desfilavam a linha infantil.Em seu release, Fraga nos conta que queria falar de desamparo e que a imagem de uma casa vazia onde os móveis estão cobertos de lençol foi uma forte referência para suas criações. A canção “Music and Me”, do Jackson Five, contribuiu para o clima. Fraga entra para os aplausos, todos se levantam. Durante todo o desfile penso que terei de contrariar todas as regras da imparcialidade jornalística e dizer que, além de estilista de mão cheia (o estilo da marca é inconfundível), Fraga é autor de performances inesquecíveis e responsável por um arroubo que, confesso, me fez derramar uma lágrima tímida. Quando vejo as caras sorridentes saindo da sala 1 da Bienal vejo que não fui só eu. Por Julia Wahmann
Foto: Ines Rozario